sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

"Hoje é a noite"



Machico, a leste da ilha, no sítio das queijadas

Se coubesse aqui esta imagem, eu diria que me apareceu um pacote de açúcar com a seguinte menção: “Uma noite digo-te tudo o que gostaria de ouvir. Hoje é a noite.” Não havia pontos de exclamação mas tudo cabia naquele esguio traço que termina com um ponto no chão.
Ontem, fui despedir-me de um amigo, ao aeroporto; ao telefone, ele dizia que estava no café das despedidas, onde se vê o mar e o céu (vê-se a pista donde parte a Amália Rodrigues, o José Régio e outros aviões) e, ao fundo, as Desertas que descansam.
Depois, ele foi; ninguém ocupou a cadeira que ele havia deixado vaga porque ninguém a poderia ocupar. Daí por um bocado, desviámos os olhos do mar de olhares que navegavam naquela mesa que nos unia para poder vê-lo partir, no avião cujo nome não sabíamos. Um dia, talvez, veremos o seu nome no avião e na sua barriga entrarão meninos e meninas com os olhos que brilham como a estrela de Belém porque vão estar no “mar de ar”. Tal avião voará tão alto que não terá que responder às pragmáticas regras da gravidade (nem da caridade) porque nem tudo o que sobe terá que cair e, poderá então cair-se para cima, enlevar-se.
Há luzes que piscam no presépio no sítio das queijadas, em Machico, como as asas do avião que foge às leis (da gravidade e dos homens) e piscamos os olhos também.
Feliz Natal a quem deixa aquele lugar vazio à volta da mesa que nos une!
O meu amigo, esse, pensaria no avião, naquele menino que une o asfalto à favela, (agora, comunidade) levando sonhos de pouca dura e trazendo notas, no intervalo de um Natal.
Mas o meu amigo, sabido, deixou-nos duas amigas para que o Natal não se acabasse e ele (será uma ela?) não pode acabar.

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Salvo raras excepções

Um raio não cai duas vezes no mesmo lugar; e uma lágrima percorrerá duas vezes a mesma vereda no rosto?

O que sei é que o sulco invisível da lágrima deixada no rosto, marca-o, pelo menos para aqueles que o sabem ver.

sábado, 15 de dezembro de 2012

Newto(w)n e o comportamento da luz (em nós)


Hoje, Sábado no mundo, enquanto lavava o bule que receberia o chá preto com bergamota da Geórgia, olhei através da janela (se tivéssemos janelas seria mais fácil encontrarmo-nos num sorriso aos quadradinhos?) e vi um cobertor que esvoaçava em ondas de braços. Mesmo sem óculos consigo ver a revoada de sonhos que saia daquele cobertor, na verdade um (des)cobertor, porque, quando se lançam sonhos pela janela, presenteia-se o mundo com bocadinhos daquilo que so(nha)mos (ser).

E agora, o que se fará das (des)cobertas dos jovens de Newtown quando esvoaçarem pelas janelas? Ao ouvir falar do terrível acontecimento de Newtown, lembro-me de Newton, Isac, que realizou experiências sobre a composição da luz, estabelecendo que o estudo moderno da óptica não é mais que estudar o comportamento da luz. Hoje, apercebemo-nos que sem estudar o comportamento da luz em nós não é possível perceber, como Newto(w)n fez, que a luz branca é composta do mesmo sistema de cores que pode ser visto num arco-íris.

Avanço mais no meu tempo e encontrou um artigo sobre luz branca, ruído branco e o novo olfacto branco, que, salvaguardam, não se parece com nenhum cheiro natural.

De repente, surge-me também Pedro Cabrita Reis que é, pela mão de Teresa Villaverde Cabral, a favor da claridade.

 

Livre, num céu em voo raso

Em Londres, no início da semana, um avião com gente por dentro rasgava o céu ao mesmo tempo que me aguçava a imaginação. Para onde iriam (o avião e a imaginação)?







 
O poeta Manoel de Barros diz que "passarinhos existem para dar movimento ao entardecer. Eu me recolho no abandono para ser livre". Foi nesse entardecer londrino, onde eu via passar pássaros com gente por dentro, que ia aprendendo a ser livre; no entanto, para que me descobrisse livre, tive que procurar o outro, o que seguia por dentro do passarinho mas que passava em voo raso aqui em baixo, onde a vida se (des)cose.