quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Aos amigos que conheço e aos que ainda não conheci

Há dias, fiz uma amiga; o que poderá parecer estranho nesta relação de amizade é que nunca me encontrei com esta amiga e ela não sabe quem sou. Ela chama-se Debora Noal e foi-me apresentada pela Eliane, que me chegou via um link-pozinho-mágico-de-fazer-amigos[i] enviado por uma amiga (quem mais?) que já não via há muito tempo. A páginas tantas da entrevista, a jornalista Eliane diz da Debora “E, quando abraça as pessoas, abraça. Dá vontade de se tornar amiga dela pelo resto da vida”. E tornei-me. Eu conheço esse abraço-revelador que confirma esse laço de sangue que não existe; quem nunca experimentou esse gesto? Um abraço seria porventura a negação do braço (a-braço) porque o braço já não é nosso; só existe nessa união, entre nós e o(a) amigo(a), nesse abraço.
Pensei na Debora quando reatei o contacto com uma amiga com quem já não falava há mais de quatro anos; contudo, o que há de bom nas relações com os amigos é que o tempo se suspende quando não estamos com eles e, quando reaparecem, o tempo reata como se um hiato de quatro anos fosse uma pequena pausa de café.

A Debora, a minha amiga que me deu a conhecer a Debora, os amigos com quem tenho reatado o abraço suspenso e todos os amigos que conheço e os que ainda não conheço (co)movem-me e, como dizia o Manuel Zimbro, "o que nos sustenta move-nos - e dê lá por onde der".

Aviso à navegação: não percam a entrevista da Debora feita pela Eliane nem o artigo “amigos para sempre” do Miguel Esteves Cardoso, que me foi também enviado por um amigo. Não resisto a deixar aqui uma pequena citação deste último artigo: “O tempo não passa pela amizade. Mas a amizade passa pelo tempo. (…) Somos amigos para sempre mas entre o dia de ficarmos amigos e o dia de morrermos vai uma distância tão grande como a vida”.



terça-feira, 27 de setembro de 2011

A harpa e a empatia pela harpa

Sento-me no parque que tem o nome do laranjal que outrora aí existia (Parc de l’Orangerie), em Estrasburgo. Perto de mim, há um senhor que fala sozinho; ele está descalço como o harpista do concerto de Domingo. Fomos a um concerto no decorrer do festival “Musica” e, no intervalo, um senhor de blazer aos quadrados subiu ao palco e pôs-se a tocar harpa; abraçava a harpa com afeição e tocava-a com estima, o que já vai escasseando, mesmo entre humanos. Imaginei-o na sua sala alcatifada e em cores outonais a observar a sua harpa, que lhe retribuía o olhar compenetrado. Na segunda parte do espectáculo, o senhor já vestido com a “farda” de músico (afinal, às vezes, o hábito parece ajudar a fazer o monge) tocava, descalço, a harpa. Lembro-me de, há muitos anos, ter ido a um concerto dirigido pelo maestro Vitorino de Almeida no Teatro Municipal do Funchal (de seu nome Baltazar Dias, homem das letras cego). Vitorino de Almeida gracejou porque tiveram que trazer a harpa com que tocavam de Portugal Continental porque, na altura, a Madeira não tinha uma harpa. Nessa altura ser-me-ia difícil imaginar que o arquipélago da Madeira teria várias cidades, túneis a esventrar as distâncias e uma dívida de uma ordem que é difícil de imaginar, quanto mais pronunciar. Hoje, temos harpa e tudo o mais. Teremos também a empatia do senhor do blazer aos quadrados pela sua harpa?

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Em busca da Primavera Árabe

Hoje, procurei a Primavera (não a das Flores mas a) Árabe na Livraria Kléber, em Estrasburgo. Esta foi a conversa que se seguiu:
Eu: "Procuro a Primavera Tunisina mas não a encontro; têm-na cá?".
Livreira:"Isso é sobre a Primavera Árabe, não é?".
Eu: "É!".
Livreira:"Então procure no segundo andar".
(Como é que eu poderia ter pensado que uma revolução estaria no rés-do-chão, ali à mão de semear?).
Já no segundo andar o livreiro diz-me que a primavera tunisina está esgotada e pergunta-me se eu a quero encomendar. Penso cá para mim que gostaria de encomendar a Primavera Tunisina, a das Flores - no arquipélago donde sou natural, a Madeira - uma mudança de regime e um sistema societário mais justo (não só mas também no arquipélago donde venho); contudo, acabo por dizer ao livreiro "non, merci".
(Aviso à navegação: esta conversa teve lugar quando entrei na referida livraria à procura do livro de Abdelwahab Meddeb, "Printemps de Tunis"; o título é também digno de registo porque não fala de uma Primavera Tunisina mas de uma Primavera da capital, Tunes).